sexta-feira, 20 de dezembro de 2013

Autocarros em Dezembro

Olááá, ervilhas!

Como o título revela, vou falar de viagens de autocarro durante o mês de Dezembro. Mais propriamente, da viagem que eu fiz de autocarro, ontem. Vim da Lata para Lisboa. Viagem que segundo a memória ervilhesca demorava umas loucas cinco horas (com paragem de uma hora em Viseu). No entanto, foi de umas ainda mais loucas seis horas e vinte largos (larguíssimos) minutos de atraso. Viva a minha memória, viva o meu traseiro espalmado naqueles bancos.

Fui a rebolar da Lata até à central onde apanhei o autocarro. Estava um tempo maravilhoso! Vento e chuva, mas não era uma brisa agradável ou uma chuva calma e até bonita. Não. Era uma tempestade, eu comi cabelo, tomei banho outra vez, enfim, parecia acabada de sair de uma lavagem automática. Todos os pneus limpinhos. Mas cheguei. Depois de ver a minha bela figura pós-lavagem automática, decidi que não valia a pena tentar pentear-me, visto que tinha de passar na rua para entrar na viatura.

Apanhei o primeiro autocarro da manhã, na esperança também de ir pouca gente e de não apanhar trânsito na chegada à grande cidade. Só a ervilha rebolou para o autocarro na paragem na Lata e, ao entrar, perguntou a si mesma se não estaria numa excursão da terceira idade. Os dez primeiros lugares de cada lado, na parte da frente da viatura estavam todos ocupados por senhores e senhoras com um ar muito simpático.

A ervilha nunca encontra os números dos lugares nos autocarros porque ora estão em cima, ora em baixo e ontem, pareciam não estar em lado nenhum. Estava à procura dos números e sendo a única ervilha de pé no autocarro, todos os outros passageiros estavam a olhar para ela - momento de embaraço. Iam sorrindo e alguns disseram bom dia, senti pena por parte deles. E vendo bem, seria compreensível que tivessem. Da porta da central até ao autocarro não consegui abrir o olho esquerdo, e o olho direito só não fechava porque tinha entre as duas pálpebras uma madeixa de cabelo que parecia estar convencida que era ali que devia estar. Despenteada, ligeiramente encharcada, com uma mochila que parecia um barril e uma mala pequenina que andava quase pendurada em mim por acaso. Ainda estava no meu sexto sono, toda eu encarquilhada, como as ervilhas congeladas no supermercado. Estranho seria se não tivessem pena do estado da ervilha.

Se ainda não entraram no espírito natalício, façam uma viagem destas - mas não tão longa. Todo o autocarro cheirava a Natal. Em todas as paragens entravam mais pessoas cheias de caixas de cartão com coisas escritas à mão. Quando saí do autocarro na pausa em Viseu, reparei na bagageira, parecia uma maternidade de caixas de comida. Comida, comida e mais comida! Dava seguramente para fazermos uma ceia de Natal ali mesmo. Habituada ao cheiro natalício, lá estava a ervilha sentadita, verde e (des)cansada. 

Chegamos a Coimbra e aí sim, o autocarro enche por completo. Só queria dormir e rezava para ninguém se sentar ao seu lado. A ervilha tem uma espécie de paranóia. Odeia dormir em transportes públicos porque se sente observada e imagina sempre que se fechar os olhos por mais que dois segundos, quando os abrir vai estar alguém a menos de vinte centímetros da sua cara. Ontem decidi ultrapassar essa paranóia e dormir. Mas o mundo, sempre contra a ervilha, sentou ao meu lado um rapaz que além de falar aos berros e não se calar durante mais do que trinta segundos seguidos, fixava o olhar na ervilha de uma forma muito desconfortável. Mas não é tudo. Quando o rapaz se sentou, a ervilha quase chorou, implorando por voltar a cheirar a comida natalícia, até os enchidos. O perfume do rapaz era bem natural e intenso. Enfim, como caracterizar o seu fedor? Chanel Sovaquel. Mas sovaquel de reserva, de há uns bons anos, diria.

Já em Lisboa, o trânsito, a voz e o cheiro do rapaz, as horas passadas em tortura e a dormência do meu traseiro, fizeram-me desejar partir a janela e rebolar até à paragem. Nunca desejei tanto chegar a Sete Rios. 

Quando chegámos, deu-se conta que o desespero por sair do autocarro era geral, todo mundo louco a tentar sair primeiro. Levantei o punho direito e ameacei toda a gente, fui a primeira a sair. Entretanto regressei à realidade e enquanto via a fila de gente para sair dali, perguntei a mim mesma se ia conseguir andar, visto que a dormência do traseiro se alastrou às pernas.

No meio de empurrões e demasiado contacto físico cheguei ao fundo das escadas do autocarro. Parei, abri os braços e ouvi, na minha cabeça, "run Forest, run". Um senhor atrás de mim empurrou-me e cortou o momento poético-cinematográfico. Não corri em câmara lenta porque ia levar um carolo das pessoas que estavam atrás de mim, mas quando pisei o chão senti-me verdadeiramente feliz.

Sentada num sofá e prometendo a si e à Lata que tão depressa, não volta a andar de autocarro, a Ervilha Incompreendida despede-se.

quinta-feira, 21 de novembro de 2013

Folhas Menosprezadas

Ervilhá!

Chegou o momento de falar da vida das folhas. As folhas das árvores que todos conhecemos. Ninguém lhes dá valor, ninguém as compreende. A Lata tem a preocupação de dar valor às minorias e por isso vou dar-vos a conhecer a cruel e injusta vida das folhas.

Como sabem, no início da Primavera, as folhas verdinhas (tal como nós, ervilhas) começam a encher os ramos das árvores e a abraçá-las cheias de amor e dedicação. Passam assim a Primavera e o Verão, sem nunca largarem a árvore amada, entregando-lhe todo o amor e tempo que têm. Bonita história de amor, não é? NÃO.

Chega o Outono e sem sabermos bem porquê, a árvore decide atirar as folhas para o chão, excluí-las da sua vida. Como se o amor tivesse morrido ou até mesmo como se nunca tivesse existido. A opinião pessoal da ervilha é que as árvores de folha caduca sofrem, provavelmente, de um distúrbio de personalidade que se manifesta no início da nova estação e é isso que as leva a tomar esta atitude tão rude, insensível e reprovável. 

Agora vejamos o lado das folhas. Passam meses a viver com e para a árvore e com a chegada do Outono são expulsas da sua nova casa, deixadas na rua. São abandonadas, perdem a cor e arrastam-se pelo chão durante semanas e semanas. Algumas entregam-se ao alcoolismo colocando o caule nas tampas das garrafas de bebidas alcoólicas junto aos contentores do lixo. São varridas indelicadamente pelos varredores municipais e pisadas até à morte. Sim, a sociedade mata folhas inocentes de coração partido diariamente. É por isto que devemos respeitá-las e tentar prestar apoio psiquiátrico às árvores para deixarem a poligamia e  não destruírem mais vidas de pobres folhas. 

Não quero alargar-me muito na questão do alcoolismo das folhas, mas notem que é um assunto particularmente perturbador. Se vocês são daquelas pessoas que nos passeios a pé pegam numa folha caída no muro e brincam com ela até ao vosso destino, comecem a reparar nos caules. Se estiverem húmidos ou cheirarem a álcool, adiem um pouco os vossos planos e levem-nas a uma Associação de Folhas Alcoólicas Anónimas, por favor. 

Um assunto ainda mais perturbador, a prostituição. Quando as tampas não chegam para todos os caules, algumas folhas mais desinibidas, recorrem à prostituição. Cuidado com isso, cuidado com as folhas que já não se encontram inteiras, isso corresponde a nudez.

Na ressaca do divórcio das folhas, além dos maus caminhos que algumas tomam, temos aquele tipo de folhas que se atiram contra nós, que caminhamos pela rua, a fim de libertarem a raiva que depois da separação das árvores as invade. Outras, atiram-se para cima dos carros estacionados e colam-se ao vidros, implorando por atenção e que nem com o limpa pára-brisas a funcionar descolam. Essas, que resistem à força do limpa pára-brisas, são as masoquistas, gostam de ser agredidas e mantêm-se coladinhas ao vidro. As que se atiram para poças de água, provavelmente, tentam o suicídio por afogamento. Por último, visto que se tornam folhas sem abrigo, muitas preenchem o formulário para tentarem receber o rendimento mínimo garantido do estado, vejam como a situação é grave. Elas sofrem tanto, como podemos ignorar o que acontece mesmo debaixo do nosso nariz?

Espero que agora olhem de outra forma para as folhas caídas no chão, que as respeitem e cuidem delas, se possível. Caso vejam tampas de bebidas alcoólicas no chão, coloquem-nas fora do alcance destes frágeis seres. Tenho esperança que reflictam seriamente sobre o que vos contei.

Até à próxima publicação, a Ervilha Incompreendida despede-se!

terça-feira, 19 de novembro de 2013

Fases do Estudo

Ora viva, ervilhas!

Todos sabemos a dor que é ter um teste, o peso que sentimos no dia antes. É disso que vou falar hoje. Podia ser um tema mais original, sim, mas sinto necessidade de vos confortar. Tenho teste amanhã *lágrima no canto do olho*, e o dia anterior é sempre o mais difícil. Espero que ao partilhar o meu sofrimento, acalme o vosso. Passo a explicar as fases do meu estudo no dia anterior ao teste.

1ª - Calma
Nesta fase, a ervilha sente-se calma. "Já estudei, estou dentro do assunto, vai correr bem."

2ª - Dúvida
A ervilha começa a questionar tudo o que pensava já saber bem. "Mas pode não ser assim, ali tem uma vírgula que pode querer dizer que afinal sou um rabanete."

3ª - Pânico
Perde o controlo e grita sozinha, gesticulando e simulando ameaças físicas contra a parede da lata enquanto chora compulsivamente. "NÃO SEI NADA, VAI CORRER MAL! VOU SER UMA ERVILHA DESEMPREGADA, VOU TER DE EMIGRAR E PASSAR A VIDA A MATAR MOSQUITOS, VAI SER ESSE O MEU TRABALHO EM ANGOLA. OH MEU ERVILHEUS, VOU SER UMA ERVILHA TORRADA!" 

4ª - Aceitação
Matar mosquitos não é assim tão mau, acaba por ser engraçado e não posso ser presa por mosquitocídio. Podia ser pior, acabar num congelador de supermercado seria definitivamente pior. 

5ª - Desespero
A ervilha larga os livros e mergulhada em lágrimas, ajoelha-se no chão da lata e pede a todos os ervilheuses (deuses das ervilhas) que a ajudem. Normalmente eles enviam braçadeiras e bóias para a ervilha não se afogar no meio das lágrimas e do desespero que a circunda. 

6ª - Recuperação 
A ervilha recupera a sua sanidade mental, decide pousar o livro e ir dormir. 

E é assim que passo as vésperas de testes, numa montanha russa sentimental. Queridas ervilhas, estudem. Neste momento, estou na fase da dúvida e a preparar-me para o pânico.

OH ANGOLA, NÃO SEI SE A MARIQUINHA VAI MAS EU VOU!

Pronto, acho que já ultrapassei a fase do pânico. Vou voltar ao estudo. 

sábado, 9 de novembro de 2013

Meias Solteiras

Ervilhá!
(ai, saudades deste olá)

Voltei mesmo. Hoje venho partilhar o grande drama das meias. É um tema que, na minha opinião, o mundo evita, por uma questão de conforto. Mas não escondam mais isto, é normal, temos de nos unir e aceitar a vida. Temas como este têm de ser falados, é por estas pequenas coisas que as ervilhas querem revolucionar o mundo.

Todos perdemos meias. Toda a gente perde uma meia no sítio onde guarda o calçado, no meio dos lençóis, numa mala de viagem e, na maior parte das vezes, no buraco negro que existe dentro de todos os cestos de roupa. Quanto a vocês não sei, mas aqui na ervilhandaria (lavandaria da lata), quando algumas meias perdem o seu par, são postas de lado. Chega! Porque não aceitam meias solteiras? Reparem, não faz sentido as meias terem de ser iguais nos dois pés. Se usarmos uma azul no pé direito e uma amarela no pé esquerdo a órbita da lata não muda, o céu não cai, a galinha Francisca não põe menos ovos.

Pessoalmente, as meias que são dobradas com o par igual, são as primeiras a usar, mas quando acabam, uso uma de cada. Pego em duas meias solteiras e mostro-lhes que é possível amarem outra vez. Falo a sério, modéstia à parte, sou o cúpido das meias. E vocês, se ainda não são, deviam ser. 

Pelo mês de Novembro temos os Casameias, cerimónias que servem para devolver às meias abandonadas a noção de amor, permitindo que se casem. E colocando novamente a modéstia de lado, digo-vos com orgulho que já juntei mais de vinte pares de meias que são hoje extremamente felizes em redor dos meus pés. Sinto mais amor nestes pares de meias que nem todos conseguem aceitar do que nas meias iguais, que se cansam uma da outra e caem na rotina. Estão sempre juntas, vão aos mesmos sítios, torna-se aborrecido. E lembrem-se, se a vossa avó vai dando "um pontinho" nas meias que começam a romper pelo uso, dá nas duas ao mesmo tempo pois são usadas com a mesma frequência. Como é que estas meias se apoiam no pós operatório? Com meias diferentes, com histórias e viagens diferentes, as intervenções cirúrgicas como as costuras não acontecem necessariamente na mesma altura, por isso, a meia-paciente que está na recuperação, tem todo o apoio da outra. Isto é um detalhe muito importante e determinante no sucesso da relação das meias e da sua felicidade.

Acordem. Ninguém quer passear um par de meias infelizes e cansadas. Vamos dar a oportunidade a cada meia que guardamos na gaveta de conhecerem um novo amor, não lhes retiremos a vida por terem perdido o seu primeiro par. Amem de novo, meias!

A ervilha despede-se sem qualquer ideia para uma despedida mais decente. :)

quarta-feira, 6 de novembro de 2013

O Regresso da Ervilha

Heeeeeeeeey Ervilhada!

Pois, parece que sim. Ao fim de um ano e meio sem uma única ervilha rebolar por este blog, a Ervilha Incompreendida está de volta *aplausos*. Podia tentar justificar a ausência prolongadíssima com uma desculpa elaborada e "esfarrapada", mas não. Vou contar-vos a verdade. Peguem em lenços, pelo sim pelo não, pode ser comovente.

Ora, a última publicação na lata foi feita no dia 1 de Maio de 2012, há precisamente dezoito meses e quatro dias, falando-vos do caso de possessão do meu belo telemóvel. Se não estão a par do tema, a solução para estes casos são os exorcismos. E assim sucedeu, na noite do dia 1 foi feito, na lata, um exorcismo. Durante este ritual é necessária uma ervilha-padre-exorcista e o cumprimento de uma lista de regras:

1. Não olhar directamente para a ervilha/objecto possuído;
2. Não cair na tentação de rolar com o possuído(a) pela lata fora, não importa o quão aliciante poderá parecer;
3. Não errar uma única palavra ao rezar a Ervilha Nossa;
4. Humilhar com alguma contenção o ervílhito (espírito leguminoso) mostrando-se espiritualmente superior e mais forte;
5. Nunca comer pão integral nas 6 horas anteriores ao ritual;
6. Não usar ganchos, brincos ou qualquer coisa que possa servir de palito ao demónio;
7. Nunca dizer 'Anticonstitucionalissimamente';
8. Não dialogar directamente com a força malígna com outro propósito que não o de saber o seu nome.

Poucas, certo? Pois. No entanto, para a comunidade ervilhesca, foi extremamente complicado cumpri-las. Passo então a relatar detalhadamente a preparação e a realização do Exorcismo Verde.


Sim, sou uma ervilha estrábica. E sim, o paint é muito complexo
para mim, desculpem migos.

Às nove e meia da noite as ervilhas que iriam participar na salvação reuniram-se no canto superior direito da lata (frequentemente usado como sala de reuniões) para reverem todas as regras e se prepararem para o serão longo e complicado. Meia hora depois, já se encontravam no local escolhido, com o telemóvel bem sentadinho numa cadeira forrada com os restos da saia amarela da Matilde (ervilha sensual que fez parte do grupo responsável pelo exorcismo) e a ervilha-padre-exorcista com o seu livro "Exorcismos para Ervilhas". E assim, começou o ritual, com quatro ervilhas presentes, além do telemóvel. Nem um minuto da longa noite tinha passado, já regras tinham sido quebradas.
Anastácio, a ervilha-padre-exorcista assim que entrou na sala escolhida, olhou directamente nos olhos azuis e brilhantes do telemóvel e comentou com este que a sua sobremesa tinha sido uma sandes de pão integral com coiratos. Como podem entender, quebrou duas regras, a do olhar representa um elevado risco de possessão do interveniente puro, ou seja, Anastácio. Quanto ao pão, podem não saber, mas os ervílhitos têm uma fixação por este alimento, correndo assim o risco de ver nas ervilhas presentes um papo seco integral fresco e apetitoso que ficaria muito melhor no seu estômago metálico. 

Deu-se então início à expulsão do demónio e como é normal nestas situações, o exorcizado tenta sempre distrair o exorcista, diminuindo o seu poder como curandeiros do mal. A regra número 7, referente à utilização da palavra 'anticonstitucionalissimamente' é, provavelmente, a mais complexa para qualquer ervilha pois esta é uma palavra que usam com bastante naturalidade e frequência. 

Matilde, a ervilha sensual de que vos falei decorou as regras e estava empenhadíssima em cumpri-las mas tal era o seu desconforto, que a sua contenção estava a tornar-se insuportável. O cheiro a coirato que perfumava a sala graças a Anastácio, a ervilha mais coirateira da lata, gerava nela um desconforto tremendo. Faço agora um aparte para explicar os motivos do seu incómodo. Disse-vos que é sensual, e é, agora. Em criança, era uma ervilha obesa. E não riam, obesidade nas ervilhas é algo delicado. Tudo bem, somos todas redondinhas, mas obesas, tornamo-nos num tremoço grande e inchado, ou se preferirem, numa azeitona mais redondita. Não é algo que passe despercebido, e no recreio, nas corridas de rebolation, as ervilhas obesas não podem participar porque é considerada uma "vitória injusta" e acreditem, são estes momentos de rebolanço que nos permitem socializar, não o fazer dificulta muito a nossa vida de socialite. Sendo uma ex-obesa, é claro que coirato é coisa que não consome, cheirá-lo dá-lhe tremores e suores frios e, em casos extremos, ouve vozes "Come gorda! Olha o coiratinho gostoso!". Como se presenciar e fazer parte de um exorcismo não fosse por si só uma situação de tensão elevada, debatia-se ainda com o seu passado dramático. Esta agitação de Matilde fez com que esta repetisse sucessivamente as regras, primeiro para si, depois ia elevando o tom até que parou e gritou precisamente vinte vezes "ANTICONSTITUCIONALISSIMAMENTE". Escusado será dizer que depois disto, sofreu uma paragem cardiorrespiratória. No ginásio aqui da lata não rebolamos nem saltamos nem nada do género, sentamo-nos e dizemos cinco vezes 'anticonstitucionalissimamente', o que é equivalente a correr uns quatro quilómetros em sprint. Pronto, estou a divagar muito. Voltemos ao exorcismo.
Depois do incidente da Matilde, o telemóvel ergueu-se e tentou dançar tango com a ervilha que estava encarregue de segurar a cadeira, esta, desde de sempre solteira, caiu no olhar sedutor do possuído e desmaiou. Todo o pânico e agitação tornaram o processo mais longo, mas a ervilha-padre-exorcista, sem saber bem como, pois tudo apontava para um enorme falhanço, conseguiu expulsar o demónio do telemóvel. Mas não acaba por aqui. 
Isto é uma ilustração que achei perfeita para vos mostrar 

como seria a Matilde ainda sensual, caso fosse humana.

Matilde, pobre ervilha, nunca conseguiu recuperar do episódio e entregou-se de novo aos coiratos e torresmos, ocupando actualmente 7,3% do espaço disponível da lata com o seu volume (mas continua a ser amada, atenção). A ervilha que dançou o tango, ficou possuída, apaixonada e acabou, mais tarde, por ter de rebolar para fora da lata. Anastácio, decidiu desistir da sua carreira de exorcista, por danos emocionais e psicológicos ao ver todos os incidentes. E mais grave... agora sim, peguem nos lenços, não há maneira suave de vos contar isto. A quarta ervilha, da qual ainda não falei, era a Gertrudes, experiente, com muitos anos de vida, que teve um fim trágico na noite do Exorcismo Verde. Numa das explosões de fúria do possuído, entre tangos, coiratos e anticonstitucionalissimamente's, acabou por ser irremediavelmente esborrachada, tornando-se em puré verde. Façamos silêncio pela alma desta ervilha que tanto deu à lata.

Apesar de o telemóvel se ter livrado do demónio que tomava conta do seu interior, nunca mais foi o mesmo devido a lesões psicológicas, tanto pelas memórias das possessões, como pelo episódio incrivelmente dramático da noite do exorcismo. Assim, como sei que entendem, os meses seguintes foram muito complicados para a lata, restaurar a felicidade foi um processo longo e trabalhoso, sem o isolamento não conseguiríamos ultrapassar tudo isto. Agradeço a cada ervilha que deu tudo de si para nos conseguirmos erguer, juntas e verdes! Espero que me perdoem e que voltem a visitar a lata regularmente. E lembrem-se, aqui nunca vão ler desculpas ou invenções, triste ou não, terão sempre a verdade. (É neste momento que eu tenho noção de que escrevi muito mais que o normal e penso que já ninguém está a ler isto, mas caso estejam, entendam que o regresso tinha de ser em grande, pelo menos em número de baboseiras. Isso, acho que consegui.)

A Ervilha Incompreendida despede-se rebolando de felicidade por voltar aqui. :3

P.S: Peço a quem ler isto que tente dizer "anticonstitucionalissimamente" alto e três vezes seguidas. Fico feliz ao imaginar alguém a fazê-lo.