quarta-feira, 6 de novembro de 2013

O Regresso da Ervilha

Heeeeeeeeey Ervilhada!

Pois, parece que sim. Ao fim de um ano e meio sem uma única ervilha rebolar por este blog, a Ervilha Incompreendida está de volta *aplausos*. Podia tentar justificar a ausência prolongadíssima com uma desculpa elaborada e "esfarrapada", mas não. Vou contar-vos a verdade. Peguem em lenços, pelo sim pelo não, pode ser comovente.

Ora, a última publicação na lata foi feita no dia 1 de Maio de 2012, há precisamente dezoito meses e quatro dias, falando-vos do caso de possessão do meu belo telemóvel. Se não estão a par do tema, a solução para estes casos são os exorcismos. E assim sucedeu, na noite do dia 1 foi feito, na lata, um exorcismo. Durante este ritual é necessária uma ervilha-padre-exorcista e o cumprimento de uma lista de regras:

1. Não olhar directamente para a ervilha/objecto possuído;
2. Não cair na tentação de rolar com o possuído(a) pela lata fora, não importa o quão aliciante poderá parecer;
3. Não errar uma única palavra ao rezar a Ervilha Nossa;
4. Humilhar com alguma contenção o ervílhito (espírito leguminoso) mostrando-se espiritualmente superior e mais forte;
5. Nunca comer pão integral nas 6 horas anteriores ao ritual;
6. Não usar ganchos, brincos ou qualquer coisa que possa servir de palito ao demónio;
7. Nunca dizer 'Anticonstitucionalissimamente';
8. Não dialogar directamente com a força malígna com outro propósito que não o de saber o seu nome.

Poucas, certo? Pois. No entanto, para a comunidade ervilhesca, foi extremamente complicado cumpri-las. Passo então a relatar detalhadamente a preparação e a realização do Exorcismo Verde.


Sim, sou uma ervilha estrábica. E sim, o paint é muito complexo
para mim, desculpem migos.

Às nove e meia da noite as ervilhas que iriam participar na salvação reuniram-se no canto superior direito da lata (frequentemente usado como sala de reuniões) para reverem todas as regras e se prepararem para o serão longo e complicado. Meia hora depois, já se encontravam no local escolhido, com o telemóvel bem sentadinho numa cadeira forrada com os restos da saia amarela da Matilde (ervilha sensual que fez parte do grupo responsável pelo exorcismo) e a ervilha-padre-exorcista com o seu livro "Exorcismos para Ervilhas". E assim, começou o ritual, com quatro ervilhas presentes, além do telemóvel. Nem um minuto da longa noite tinha passado, já regras tinham sido quebradas.
Anastácio, a ervilha-padre-exorcista assim que entrou na sala escolhida, olhou directamente nos olhos azuis e brilhantes do telemóvel e comentou com este que a sua sobremesa tinha sido uma sandes de pão integral com coiratos. Como podem entender, quebrou duas regras, a do olhar representa um elevado risco de possessão do interveniente puro, ou seja, Anastácio. Quanto ao pão, podem não saber, mas os ervílhitos têm uma fixação por este alimento, correndo assim o risco de ver nas ervilhas presentes um papo seco integral fresco e apetitoso que ficaria muito melhor no seu estômago metálico. 

Deu-se então início à expulsão do demónio e como é normal nestas situações, o exorcizado tenta sempre distrair o exorcista, diminuindo o seu poder como curandeiros do mal. A regra número 7, referente à utilização da palavra 'anticonstitucionalissimamente' é, provavelmente, a mais complexa para qualquer ervilha pois esta é uma palavra que usam com bastante naturalidade e frequência. 

Matilde, a ervilha sensual de que vos falei decorou as regras e estava empenhadíssima em cumpri-las mas tal era o seu desconforto, que a sua contenção estava a tornar-se insuportável. O cheiro a coirato que perfumava a sala graças a Anastácio, a ervilha mais coirateira da lata, gerava nela um desconforto tremendo. Faço agora um aparte para explicar os motivos do seu incómodo. Disse-vos que é sensual, e é, agora. Em criança, era uma ervilha obesa. E não riam, obesidade nas ervilhas é algo delicado. Tudo bem, somos todas redondinhas, mas obesas, tornamo-nos num tremoço grande e inchado, ou se preferirem, numa azeitona mais redondita. Não é algo que passe despercebido, e no recreio, nas corridas de rebolation, as ervilhas obesas não podem participar porque é considerada uma "vitória injusta" e acreditem, são estes momentos de rebolanço que nos permitem socializar, não o fazer dificulta muito a nossa vida de socialite. Sendo uma ex-obesa, é claro que coirato é coisa que não consome, cheirá-lo dá-lhe tremores e suores frios e, em casos extremos, ouve vozes "Come gorda! Olha o coiratinho gostoso!". Como se presenciar e fazer parte de um exorcismo não fosse por si só uma situação de tensão elevada, debatia-se ainda com o seu passado dramático. Esta agitação de Matilde fez com que esta repetisse sucessivamente as regras, primeiro para si, depois ia elevando o tom até que parou e gritou precisamente vinte vezes "ANTICONSTITUCIONALISSIMAMENTE". Escusado será dizer que depois disto, sofreu uma paragem cardiorrespiratória. No ginásio aqui da lata não rebolamos nem saltamos nem nada do género, sentamo-nos e dizemos cinco vezes 'anticonstitucionalissimamente', o que é equivalente a correr uns quatro quilómetros em sprint. Pronto, estou a divagar muito. Voltemos ao exorcismo.
Depois do incidente da Matilde, o telemóvel ergueu-se e tentou dançar tango com a ervilha que estava encarregue de segurar a cadeira, esta, desde de sempre solteira, caiu no olhar sedutor do possuído e desmaiou. Todo o pânico e agitação tornaram o processo mais longo, mas a ervilha-padre-exorcista, sem saber bem como, pois tudo apontava para um enorme falhanço, conseguiu expulsar o demónio do telemóvel. Mas não acaba por aqui. 
Isto é uma ilustração que achei perfeita para vos mostrar 

como seria a Matilde ainda sensual, caso fosse humana.

Matilde, pobre ervilha, nunca conseguiu recuperar do episódio e entregou-se de novo aos coiratos e torresmos, ocupando actualmente 7,3% do espaço disponível da lata com o seu volume (mas continua a ser amada, atenção). A ervilha que dançou o tango, ficou possuída, apaixonada e acabou, mais tarde, por ter de rebolar para fora da lata. Anastácio, decidiu desistir da sua carreira de exorcista, por danos emocionais e psicológicos ao ver todos os incidentes. E mais grave... agora sim, peguem nos lenços, não há maneira suave de vos contar isto. A quarta ervilha, da qual ainda não falei, era a Gertrudes, experiente, com muitos anos de vida, que teve um fim trágico na noite do Exorcismo Verde. Numa das explosões de fúria do possuído, entre tangos, coiratos e anticonstitucionalissimamente's, acabou por ser irremediavelmente esborrachada, tornando-se em puré verde. Façamos silêncio pela alma desta ervilha que tanto deu à lata.

Apesar de o telemóvel se ter livrado do demónio que tomava conta do seu interior, nunca mais foi o mesmo devido a lesões psicológicas, tanto pelas memórias das possessões, como pelo episódio incrivelmente dramático da noite do exorcismo. Assim, como sei que entendem, os meses seguintes foram muito complicados para a lata, restaurar a felicidade foi um processo longo e trabalhoso, sem o isolamento não conseguiríamos ultrapassar tudo isto. Agradeço a cada ervilha que deu tudo de si para nos conseguirmos erguer, juntas e verdes! Espero que me perdoem e que voltem a visitar a lata regularmente. E lembrem-se, aqui nunca vão ler desculpas ou invenções, triste ou não, terão sempre a verdade. (É neste momento que eu tenho noção de que escrevi muito mais que o normal e penso que já ninguém está a ler isto, mas caso estejam, entendam que o regresso tinha de ser em grande, pelo menos em número de baboseiras. Isso, acho que consegui.)

A Ervilha Incompreendida despede-se rebolando de felicidade por voltar aqui. :3

P.S: Peço a quem ler isto que tente dizer "anticonstitucionalissimamente" alto e três vezes seguidas. Fico feliz ao imaginar alguém a fazê-lo.


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